sábado, 20 de fevereiro de 2016

Dicas contemporâneas de escrita

No texto que segue abaixo, Edson Cruz, poeta e editor do site Musa Rara, transmite algumas dicas um tanto diferentes, inclusive na maneira de expô-las (é um poeta, afinal) para aqueles que gostam de escrever. Vale conferir:

A gravidade sem peso

O escritor contemporâneo, na construção de seu projeto literário, deve ter um plano de voo (um projeto) com uma estrutura leve como a ossada de um passarinho, cujo objetivo maior seja o de fazer com que o leitor e o texto decolem juntos e, por que não, o próprio autor.

Algumas dicas práticas, referentes ao trabalho com o texto são sempre bem-vindas. Façamos bom proveito delas:

1. O toque de leveza transforma as frases explícitas do texto em sutilezas que surpreendem e fisgam o leitor seduzindo-o para a continuidade da leitura.

2. Aparar as pontas das palavras gastas pelo uso, das frases vazias, das observações desnecessárias e das descrições muito longas.

3. Saber a hora de evitar um adjetivo desnecessário.

4. Saber eliminar um advérbio cujo sentido já está implícito no verbo da frase. Evitar as explicações. O leitor deverá compreender, por si mesmo, a trajetória do texto em voo.
5. Mantê-lo (o leitor) ligado no texto, evitando repetições e remissões.

6. O excesso de gordura e peso de um texto advém de nosso medo pessoal (a escritura não é lugar de uma terapia pessoal), de nossa ansiedade, da pressa (o afã de ser reconhecido, de publicar, de marcar presença) ou da pressão externa (aceitar prazos que não sejam os de sua própria criação).

7. Esvaziar a linguiça (enchê-la qualquer um faz, esvaziá-la com estilo é o desafio). Frases extras diminuem o ritmo e tornam o texto enfadonho.

8. Aprender a reescrever o texto quantas vezes forem necessárias (não esquecer a prática ensinada por João Cabral ou por João Gilberto) para deixá-lo respirar aliviado e airoso. Sim, leveza não é só cortar, mas, também, reescrever, redistribuir palavras, frases, ideias, enfim, reorganizar.

9. Ouvir a melodia do texto e buscar a harmonia necessária. Onde está a tônica, a terça e a quinta de seu texto? A terça é menor ou maior? O acorde precisa de uma sétima menor, uma nona? Você quer realçar o trítono?

10. O ritmo do texto entra em consonância e no compasso da tônica, seja ela uma imagem, uma ideia, uma palavra. Ao ler em voz alta os sons do tecido textual poderão nos alertar para cacofonias e inadequações em vários níveis.

11. Literatura busca ambiguidade, mas não a confusão. De confusão o mundo está cheio. O escritor, assim como o músico, surge para colocar ordem no caos, mesmo que seja uma ordem não reconhecida em um primeiro momento, uma ordem caótica.

12. Ter consciência de que técnica e background (um autor sem vivências, sem leitura, sem o sofrimento, sem a alegria, sem o desespero, pode ser facilmente substituído por uma máquina de produzir textos sem ossatura) são duas coisas totalmente diferentes e igualmente importantes para um escritor.

13. Nunca deixar de buscar um estilo próprio e pessoal de escrita. Parece redundância, mas é a coisa mais difícil de alcançar. Estar só sem desprezar o mundo e os seres é um exercício digno de um Buda.


Os ossos da escrita são colosso.

Autor: Edson Cruz

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