Amanda entrou pela porta do quarto. Seus olhos estavam vermelhos e inchados. Chorara por quase uma hora, escondida no quintal. Somente depois que os pais saíram para fazer compras voltou para dentro de casa.
Ela
bateu a porta do quarto com força, trancando-a por dentro. Sentou-se na cama e
abriu seu diário de confissões. Estava disposta a escrever pela última vez. Na
verdade, era uma carta de despedida para os pais e amigos íntimos. Uma, duas,
três palavras... rasgou a página. Enxugou as lágrimas que escorriam pelo rosto
e recomeçou. Agradeceu, desculpou-se, fez promessas que não poderia cumprir ou
que fatalmente cumpriria por não estar mais viva para quebrá-las.
Abriu
a porta do quarto e foi até a garagem. De dentro de uma caixa cheia de
cacarecos pegou uma corda velha, que provavelmente jamais viesse a ter
utilidade alguma, ou que talvez estivesse guardada especialmente para aquele
momento. Olhou para o irmão mais novo, entretido em frente à televisão. Despediu-se
dele com um olhar terno, até que retornou ao seu desespero.
Trancou-se
novamente no seu quarto. Viu no criado-mudo, ao lado da cabeceira da cama, a
foto dos dois. Ela e seu, agora, ex-tudo. Pareciam felizes. Parecia eterno.
Agora lhe restara apenas um imenso sentimento de vazio. Faltavam-lhe
perspectivas, sonhos, planos. Encheu-se de ira, tomando o porta-retrato nas
mãos, disposta a quebrá-lo ao meio. Reconsiderou, e aninhou-o junto ao peito,
até que em um rompante arremessou-o pela janela, vendo-o chocar-se contra o
muro que cercava a casa.
"Maldito!
Traidor! Cafajeste! Canalha..." e todos os demais adjetivos de que
dispunha em seu vocabulário lhe vieram à mente para qualificar aquele que a
destituíra da felicidade. Ele merecia ser punido. Merecia a morte!
Amanda
ligou o computador. Fez uma rápida pesquisa na Internet. Ensaiou o laço
algumas vezes no próprio pescoço. Subiu na cama, esticando-se para fazer passar
a corda por entre os caibros e telhas. Deu alguns fortes puxões para testar a
resistência dos caibros. Pendurou-se, para certificar-se de que nada falharia.
Suas
mãos começaram a suar. Lembrou-se da televisão no quarto. Ligou-a e aumentou o
volume. Fechou a janela. Subiu outra vez na cama, olhando para a TV. Fez o laço
passar pela cabeça, encaixando-o no pescoço. Ficou na ponta do colchão, até que
se lembrou de um filme a que assistira. Deu-se o luxo de ter um fim
cinematográfico. Foi até a cozinha, pegou um banco e voltou para o ponto em que
estava. "Agora sim", pensou. Fez um último pedido a Deus: que
consolasse seus pais.
Amanda
sentia seu coração acelerado, pulsando até quase saltar do peito. Cerrou as
mãos suadas, tentando encontrar forças. Fechou os olhos e ficou parada, em
silêncio, por alguns segundos. Uma mulher falava na TV sobre o fracasso de seu
casamento, de como sofrera e superara os momentos de tristeza comendo
chocolates e conhecendo alguém legal.
Amanda
abriu os olhos, como se uma luz houvesse acendido em seu consciente. Lembrou-se
de que havia uma caixa de bombons de chocolate na geladeira. Talvez
funcionasse. Retirou o laço, encobriu as provas, comeu toda a caixa de
chocolates e entrou em um bate-papo online para solteiros.
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